ENSAIO SOBRE O ACASO
Edmarcos
Martins Jordão
“O bater das asas de
uma borboleta, em Tóquio, pode provocar um furacão em Nova Iorque”.
Essa frase aparentemente
exagerada reflete a complexidade que os sistemas dinâmicos não lineares têm
apresentado a ciência. A incerteza sobre as certezas tem natureza agora bem
mais que científica e tão longe não fogem a os debates de natureza filosófica e
religiosa.
O conceito de que nada acontece
por acaso, de que as pessoas são marcadas pelo destino, parece estar menos
evidente do que se pensa, afinal de contas, a previsibilidade de acontecimentos
em longo prazo tem se mostrado bem mais difíceis que a maioria das pessoas
possa imaginar. Os modelos de previsões utilizados pela humanidade até então
tem um limite muito claro: são úteis em um pequeno intervalo de tempo, mas são
quase que totalmente ineficazes em escala de tempo maior. Um exemplo clássico
disso são as previsões do tempo.
O menor distúrbio em um pequeno
sistema pode provocar grandes consequências à frente em um sistema bem maior e
complexo. E é isso que os cientistas têm observado, quase que perplexos, em sua
incapacidade de saber mais sobre o futuro devido a sua natureza aleatória e
imprevisível. De certa forma isso acalora o debate filosófico entre ciência e
religião, porque enquanto esta primeira fala sobre a imprevisibilidade das
coisas em escala maior a segunda diz que tudo está planejado e tem um futuro
plenamente estabelecido.
No seu Ensaio sobre o Caos, John
H. Hubbard, do departamento de matemática do Cornell University, Estados
Unidos, pondera sobre pequenas ações e que mesmo o jargão já bem utilizado pelo
cinema e pela indústria de ficção soa agora como ciência real, a saber, o
pequeno bater de asas de um pequeno ser indefeso e irrelevante perante todo um
sistema de coisas, pode provocar um furacão em outro lugar do mundo. “Uma
justificativa sobre o efeito borboleta não é de maneira alguma óbvia”, diz ele
e acrescenta:
Uma consequência dessa análise é que
previsões do tempo para períodos longos são completamente impossíveis. É
inconcebível que alguém possa saber o estado da atmosfera como consequência do
efeito borboleta, ou mesmo em uma escala mil bilhões de vezes maior.
Perturbações dessa escala decisivamente afetam a atmosfera em um mês. (ZILL, pag. 221, 2011; apud Hubbard,
2001).
A imprevisibilidade da vida de alguém
Suponhamos que os resultados
dessa pesquisa sejam mesmo verdadeiros e trabalhemos com essa hipótese. As
consequências disso são imediatas. Imagine um se humano que até então achava
que as suas ações já foram programas por um ser superior (deus). Para ele suas
ações são reflexos do planejamento desse ser, mas isso é um absurdo, pois um
menor desvio do comportamento desse sistema, como foi visto, pode provocar
imensas alterações na frente. eguidas vezes em nosso cotidiano somos imbuídos a
tomar decisões de toda a natureza. Tomar a responsabilidade por todas essas
ações e governá-las de modo a manipulá-las em pró de um objetivo parece ser
improvável e explode nas probabilidades de realmente acontecer à ordem de
bilhões de vezes.
Veja o caso descrito por Hubbard
sobre um hipotético modelo. Considerando um sistema matemático de que cada
tique de um relógio um ângulo é dobrado. Um primeiro estado desse sistema seja certo
ângulo θ0, o segundo estado θ1... E assim vai. Seja a seguinte sequência:
θ0, θ1, θ2, ..., e que θn + 1 = 2θn
Isto é, a cada ângulo θ o seguinte dobra. Se o θ0 sofrer uma
perturbação, seja pelo balanço do vento nos ponteiros, uma mosca que sentou em
algum deles atrasando-o, a bateria fraca do relógio, mesmo que seja da ordem de
um bilionésimo de uma volta, após 30 tiques do relógio será impossível
determinar seu estado. Após 30 tiques a incerteza sobre o comportamento da
dobra dos ângulos será de
isto é, cerca de
1.073.741.824 de incerteza. Isso sobre uma pequena ação. Para alterar a ação de
um ser humano, que é bem mais complexo do que uma só ação, é bem mais
assustador e absurdo do que o que se pensa!
Por outro lado tudo isso também indica a presença de um ser
supremo. Se alguns religiosos estiverem mesmo certos, foi dado a os humanos o
livre arbítrio. Então já sabemos o nome desse livre arbítrio e se chama: Caos.
Quanto mais caótico for um sistema, mas incerto ele é.
Não é apenas na vida cotidiana regida por bilhões de regras
e comportamentos que isso tem consequência. O movimento dos elétrons em um
átomo também é caótico e quanto mais se sabe sobre um elétron, digamos sua
posição, menos se sabe sobre sua velocidade e vice-versa. Estamos falando de
uma importante teoria que é aplicada sobre áreas mais avançadas da ciência, que
é a Teoria da Incerteza de Heisenberg. A teoria do Caos também foi proposta por
um famoso matemático, Poincaré.
A mudança sobre um sistema inicial pode mesmo provocar
grandes perturbações futuras, mas isso de modo algum quer dizer que se salvando
a condição inicial, todo o resto do sistema pode funcionar com toda a
previsibilidade antes conhecida. De modo algum! Considerando o sistema como uma
série, podemos, a qualquer parte dessa série, considerar o sistema como
inicial. Para esclarecer melhor observe a seguinte sequência
a0, a1, a2, ..., an, ...,
Quanto mais próximo for o acontecimento do instante inicial a0 maior será a sua
previsibilidade. Mas digamos que a0 sofra uma pequena
alteração da ordem de um bilionésimo. Quase nada, mas isso vai refletir sobre a2, que refletirá sobre a3 e assim
sucessivamente. Do mesmo modo, se alguma perturbação acontecer em an isso provocará
alterações em an+1 e assim em diante. Se
parte dos acontecimentos em
an-1 se deram de uma forma
e em an se der de outra, an+1 sofrerá as consequência e o resultado de an+2 será diferente dos
anteriores mencionados. Em outras palavras, a série divergirá e não encontrará
uma resposta satisfatória. Em suma, quanto mais longa a previsão, menor a
certeza sobre ela.
Em casos em que a série converge, qualquer parte dela também
convergirá, isto é, também terá uma resposta satisfatória. Mas o problema dos
sistemas dinâmicos é justamente esse: Não dá para prevê-los. É por isso que
muitas vezes trabalhamos com probabilidades, assim como os químicos o fazem no
comportamento dos elétrons a redor do núcleo atômico.
Se fôssemos traçar a vida de alguém ao longo de um gráfico
este com certeza não seria linear, pelo contrário, seria um caos total na sua
previsibilidade. Infelizmente nesse sentido a sequência converge, mas não para
um estado satisfatório e sim para a morte, certa a todos os viventes. Será
então esse o destino de que todos falam? Ele é a única previsão 100% verdadeira
nesse mundo, pelo menos da forma como o conhecemos.
BIBLIOGRAFIA
ZILL, Denis G. Equações Diferenciais, volume 1. São Paulo: Pearsons Makron Books, 2011.
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