sexta-feira, 4 de junho de 2010

A Geometria Não Euclidiana e as Barreiras da Matemática



GEOMETRIA NÃO EUCLIDIANA - O QUE É?

Desde a publicação de "Os Elementos", obra do matemático grego Euclides, poucas pessoas se ousavam a contrariar os princípios contidos nessa obra. Quem seria "doido" o suficiente para discordar, por exemplo, que a soma dos ângulos internos de um triângulo não é 180°?

A obra é altamente revolucionária para época e mesmo hoje ainda se constitui numa das maiores obras científicas já publicadas e, perdendo só para a Bíblia, foi o mais lido e estudado livro da história humana, um BEST SELER, diria. Dela podemos destacar muitos postulados, alguns deles polêmicos, como o quinto, que dizia: 
Se uma linha recta cortar duas outras rectas de modo que a soma dos dois ângulos internos de um mesmo lado seja menor do que dois rectos, então essas duas rectas, quando suficientemente prolongadas, cruzam-se do mesmo lado em que estão esses dois ângulos
OBS: Postulados são afirmações lógicas que o autor deseja que o leitor considere como verdades, sem para isso, contudo, haver provas ou demonstrações matemáticas.

Basicamente o que Euclides queria dizer era que duas rectas poderiam se encontrar no infinito. Pelo enunciado temos, traçando pelo menos três rectas, r, s e t, como demonstrado a seguir:


Fig. 1: As três rectas e o (V) postulado de Euclides

Pelo (V) postulado teríamos a seguinte expressão:

 

O que em termos técnicos seria impossível para uma recta, ao menos no mundo plano em que pensaríamos. Se observamos bem a figura 1 notamos que a soma dos ângulos internos ali demonstrados nunca será menor que 180, a menos que as rectas não sejam rectas, mas curvas. Rectas curvas?


ATAQUE À GEOMETRIA EUCLIDIANA

Foi a partir dessa análise do (V) postulado que surgiram questões que assombrariam matemáticos ao longos dos séculos, inclusive ao próprio Euclides que, em vão, tentou provar o próprio postulado. Será mesmo que a geometria Euclidiana não conseguiria sozinha descrever o mundo e sua realidade?

Esse tipo de geometria descreve com certa precisão o comportamento de rectas, pontos, planos, ângulos, triângulos, volumes, áreas e etc, mas chegou a um nível de ser desafiada pelos grandes gênios da humanidade. Podemos destacar Gauss, János Bolyai, Lobachevski, Rieman e Maldbrot que dedicaram parte de suas vidas no estudo e análise da geometria , o que lhes permitiu chegar à incrível descoberta que apenas não havia a geometria euclidiana, mas junto com ela pelo menos três outras geometrias:

 Geometria euclidiana
* Geometria hiperbólica
* Geometria esférica
* Geometria fractal


GEOMETRIA EUCLIDIANA

Esse tipo de geometria é a clássica e se baseia no plano. Nela se destacam pelo menos cinco postulados que praticamente permeia toda a matemática básica.

1. Entre dois pontos distintos, existe e é única a recta que passa por eles

Fig. 2: Recta AB

 2. Qualquer segmento recto pode ser estendido indefinidamente pela linha recta.

 
Fig. 3: Recta estendida

3. Dado um segmento recto, um círculo pode ser desenhado tendo o segmento como raio e um dos seus extremos como o centro.



Fig. 4: Circunferência de raio r

 4.Todos os ângulos rectos (π/2 ) são congruentes.

Fig. 5: Ângulos rectos congruentes

5. Se duas linhas intersectam uma terceira linha de tal forma que a soma dos ângulos internos em  um lado é menor que dois ângulos rectos, então as duas linhas devem se intersectar neste lado se forem estendidas indefinidamente.
Se falando de espaço temos que no euclidiano:

- Através de um ponto podemos traçar apenas uma recta paralela a uma  linha recta
- A soma dos ângulos interiores de um triângulo é igual a dois ângulos rectos
- A circunferência de um círculo é igual a π vezes o seu diâmetro.

Romper com o espaço euclidiano, seus axiomas e postulados se constituiu num dos maiores avanços da matemática, pois graças a essa ruptura pode nascer grandes teorias como a da Relatividade, por exemplo, que se baseia na geometria hiperbólica.


GEOMETRIA HIPERBÓLICA

A geometria hiperbólica é baseada na ruptura do quinto postulado de Euclides, isto é, ela reza justamente o contrário do que diz esse axioma, principalmente em se tratando da parte em que  diz que por um ponto P fora de uma recta r só pode ser traçado uma recta paralela a esta. Em outras palavras, esse tipo de geometria não só diz que é possível traçar várias rectas em P paralelas a r e sem intersectá-la, mas também possibilita aberrações angulares, propiciando até mesmo a soma dos ângulos internos de um triângulo ser menor que 180°, pois baseia-se no mundo esférico. Para melhor compreensão basta atentar à figura a seguir:

 
  Fig. 6: Rectas r e s passando pelo ponto P e paralelas à recta t


Notamos que as rectas r e s passam pelo ponto P sem, contudo, passarem ela recta t, mais abaixo. Vale notar que as rectas são construídas num modelo esférico o que torna realmente as rectas curvas. Para melhor compreensão, sobre uma laranja o leitor risque uma linha recta; em seguida recorte o gomo que desenhou a recta e o estique de modo que fique plano. Ora, é fácil constatar que mesmo fazendo esforço o gomo em "estado plano" sempre vai tender a ficar curvo como antes. Mesmo efectuando um corte sobre a linha feita no gomo o dividindo em dois outros gomos, após tal divisão verificar-se-á que a parte do corte feito em ambos os gomos perecerá curvo, não mais recto como desenhado antes. Desse modo é possível traçar infinitas rectas sobre P sem, contudo, intersectar r. 

De maneira análoga à anterior é fácil observar que ao se desenhar sob uma superfície esférica, como  por dentro de uma laranja, um triângulo ABC, ele ficará mais ou menos no aspecto da figura 7:

 
 Fig. 7: Triângulo ABC em esfera


 A soma dos ângulos internos desse triângulo é menor que cento e oitenta graus. Foi com esse tipo de geometria que Einstein construiu a Teoria da Relatividade. Se pudéssemos extrair algum desenho feito na esfera, como um peixinho, por exemplo, notaríamos que este, fora do seu "universo", se comportaria para nós com um formato de sela tal qual as que usam para montar cavalo.


Fig. 8: Peixes em geometria não - euclidiana

Note que é preciso imaginar linhas retas por dentro de um esfera e não por fora dela. Quando as rectas estiverem sobre a esfera então teremos outro tipo de gometria - a esférica.


GEOMETRIA ESFÉRICA

Certamente o que mais chama nas geometrias não-euclidianas é o fato dos ângulos internos de um triângulo não serem 180º. Com a Esférica não acontece o contrário, só que diferentemente da Geometria Hiperbólica cuja soma dos tais ângulos são menores que 180º, na Geometria Esférica essa soma é maior que 180º. Como explicar isso? Como sempre pela própria matemática que ousa desafiar suas próprias leis.

Um exemplo clássico do que a Geometria Esférica pode fazer é dado pelo deslocamento de um urso polar: Um urso polar caminharia 100 km para o sul, em seguida mais 100 km para leste e depois mais 100 km para o norte. Geralmente fazemos a seguinte representação gráfica e imaginária do acontecido, como demonstrado na figura 9:

Fig. 9: Deslocamento de urso polar na geometria euclidiana


Não obstante com esse tipo de raciocínio estamos desconsiderando a gemetria esférica da Terra, ao passo que se imaginarmos do ponto de vista esférico veremos que o urso findou seu trajeto no mesmo ponto de onde partiu. Como assim?

Como o planeta não é plano as linhas que aparentam ser rectas na verdade acabam se encurvando, do ponto de vista esférico. Se constitui esse exemplo uma bela cena de dualidade de realidades, pois as linhas de deslocamento do urso são realmente rectas, e fica totalmente atônito ao ver que o animal retortnou para o mesmo local de saída mesmo tendo seguido caminhos que a priore eram pararelos. Ele só poderá compreender o que de fato aconteceu se assumir o papel de um observador geodésico, de grandes proporções, como na Terra.

Observado atentamente o próprio planeta onde vivemos fica fácil perceber o que a matemática quer dizer:

Fig. 9.1: Planeta Terra e o triângulo geodésico. (WIKIPÉDIA, 2010)

Perceba que o deslocamento do urso é semelhante ao da figura 9.1, o que confirma o fato dele findar sua viagem no mesmo ponto de partida. A contrário do que ocorre no mundo plano, as linhas geodésicas, nome dado a esse tipo de desenho sobre a superfície da Terra, se "encurvam" sem, no entanto, deixarem de ser rectas produzindo um encontro de rectas que formam um triângulo mais bizarro ainda cuja soma de angulos internos é maior que 180°.

 
Isso difere da Geometria Hiperbólica onde essa mesma soma é menor que cento e oitenta graus e ambas são geometrias não - euclidianas.


GEOMETRIA FRACTAL

Certamente esta é a mais encantadora e fascinante geometria não-euclidiana a se comentar. Introduzida pelo matemático Benoit Mandelbrot, é também chamada de Geometria do Caos e descreve com tamanhha sutileza e beleza todos os mistérios das formas geométricas encontradas na natureza. Um exemplo de uma figura fractal está logo adiante


Fig. 10

Fig. 10.1

O termo Fractal siginifica, literalmente, quebrar, nome bastabte apropriado pois a geometria tratada como que fragmenta os pequenos pedaços em partes cada vez menores fazendo cópias idênticas em escalas dos mais variados tamahos em ordem infinita, num comportamento caótico e sem explicações. Hoje se sabe que tais figuras não tem fim e são modelagens quase perfeitas que descrevem o mundo. Uma definição mais matemática e rigorosa é demasiadamente difícil, pois ainda é um ramo cheio de mistérios e fascínio, tanto pela sua beleza como pelo seu comportamento, mas que poderia, intuitivamete, ser definido como o "todo que forma a parte e a parte  que forma o todo".

Esse ramo é muitas mais vezes complexo do que os outros três tipos de geometrias apresentadas anteriormente, complexo literalmente fazendo jus ao nome, porque é uma ciência que apela mesmo ao Corpo dos Complexos. Mesmo com a dificuldde em se definir um fractal, eles contêm certas propriedades que auxiliam, e muito, o seu reconheciemto e estudo, que são a auto-similaridade e complexidade infinita. Se o leitor atentar mais um pouco nas duas figuras acima verá que há um apadrão repetitivo em escala infinita. Em outras palavras um fractal repete o seu todo em pequenas partes que constiui o todo e isso pode até ser calculado. Totalmente diferente da geomtria convencional e bem bonito também. 

O ponto alvo da Geometria Fractal é que enquanto as outras tem no máximo três dimensões visíveis,  todas são inteiras, mas as fractaicas podem ser decimais. Quem já ouviu falar em 2,7 dimensão? Para entendermos melhor considere um caso ilustrativo: O  mundo que nos cerca é constituído de três dimensões visíveis, altura, largura e comprimento, como a figura a seguir

 Fig. 10.2: Três dimensões

É claro que há 3 dimensões, mas os fractais avançam tal conceito a chegam até mesmo a possuir 2,6 dimensões. "Nuvens, montanhas, turbulências, árvores, crescimento de populações, vasos sangüíneos e outras formas irregulares podem ser estudadas e descritas utilizando as propriedades dos fractais" (SIQUEIRA, 2005)

É sempre muito bonito observar. Veja mais exemplos:

Fig. 10. 3

Fig. 10. 4
Fig. 10.5

Fig. 10.6

Crédito das Figuras (10), (10.1), (10. 3), (10. 4), (10.5) e (10. 6): Grupo Fractarte. Disponível em: http://www.fractarte.com.br/galeria2/galeria.php.

A matemática mais uma vez encanta com sua beleza e mistério nos levando cada vez mais a brenhas do desconhecido abrindo visão à realidade que nos cerca, abismando mais ainda os paradoxos e  os conceitos mudando pessoas, mudando idéias e, sobretudo, mudando o mundo.

4 comentários:

Anônimo disse...

Por que a geometria não euclidiana não aparece com mais detalhes ,ou seja, exemplos mais explícitos nos livros didáticos do Ensino Médio? E,porque os Matemáticos como Reimman,Lobachevsk,Bolay, sequer são citados em tais livros?Parece que vivemos em um totalmente plano.

Anônimo disse...

Se a geometria não euclidiana é utilizada em Física, em Geografia,em Cosmologia,porque omití-las do estudantes em seus livros didáticos no Ensino Médio?

Anônimo disse...

Os alunos de hoje mal sabem fazer contas básicas como multiplicar e somar, estudar matemática teórica, que é difícil mesmo para pessoas que tentam fazer bacharelado nessa matéria (mais de 95% só tentam mesmo...), seria no mínimo um desastre, sem contar que praticamente nenhuma escola (muito menos públicas) teriam professores capacitados para isso.

Klaic. disse...

Conteúdo e linguagem incríveis. Ilustrações excelentes. Parabéns pela postagem, leitura muito agradável.

Matemática: Arte das Trevas?

Tudo começou quando há um certo tempo um amigo de faculdade chegou em sala de aula totalmente maravilhado com um pequeno comentário de um de seus alunos. Ele foi surpreendido pelo pequeno com uma pequena e desconcertante pergunta: "Ei, você que é o Professor das Artes das Trevas?"

Bem pode ser que a maioria das pessoas não chegue a tanto como o garoto, mas certamente também compartilham com ele o mesmo espírito desbravador dessa que é realmente uma ciência oculta e perigosa e que ensina a os homens a pensarem por si , construirem um futuro melhor e a tornar mais gratificante e facilitadora a vida.

Aqui serão tratados assuntos referentes à matemática, ao seu dia-a-adia, leitor, ao seu cotidiano, inter-nauta, à sua sede de descoberta, curioso, à todos aqueles amantes da Ciência das "Artes das Trevas". Não tenham medo do nome, é parte do homosapiens temer do desconhecido e apenas caminhamos em direção ao entendimento da matemática e a uma nova visão de mundo.

À todos sejam Bem Vindos!

A Evolução das Perguntas

A Evolução das Perguntas
Homem aprendendo a fazer fogo e a contar